Explanações de especialistas renomados, discussão de práticas aplicáveis ao campo e reflexões sobre tendências da pecuária marcaram a programação científica do 4º Fórum Brasil Sul de Bovinocultura de Corte, realizado na manhã desta terça-feira (14), no Centro de Cultura e Eventos Plínio Arlindo de Nes, em Chapecó (SC). O evento antecedeu a programação do 14º Simpósio Brasil Sul de Bovinocultura de Leite (SBSBL) e é promovido pelo Núcleo Oeste de Médicos Veterinários e Zootecnistas (Nucleovet) e pela Epagri.
PROGRAMA REPRODUTIVO EFICIENTE
A abertura da programação ocorreu com a palestra “Premissas para programa reprodutivo eficiente de novilhas e vacas”, ministrada pelo doutor Gilson Pessoa. Graduado em Medicina Veterinária pela UFSM, mestre em Fisiopatologia da Reprodução e doutor em Medicina Animal pela UFRGS, Pessoa também acumula experiência internacional como pesquisador visitante na Michigan State University (EUA).
Durante a apresentação, o especialista enfatizou a importância do manejo reprodutivo desde a recria das fêmeas até o período pós-parto, destacando os cuidados essenciais para atingir eficiência e lucratividade no sistema. “Destacamos a eficiência, a eficácia e a efetividade na reprodução, detalhando pontos que devem receber atenção do técnico e do produtor, desde a recria das fêmeas, para que atinjam a puberdade com idade ideal e de forma economicamente viável, até o manejo do anestro pós-parto, especialmente nas primíparas, que costuma se prolongar e dificultar a reconcepção.
Outro ponto enfatizado por Gilson foi o escore corporal (ECC) pré-parto, um indicador decisivo para o sucesso reprodutivo das vacas. Segundo o especialista, fêmeas que chegam ao parto com baixo ECC enfrentam maior dificuldade para retornar à ciclicidade e alcançar nova gestação. “Quando a vaca entra no parto com uma condição corporal inadequada, o intervalo entre partos se estende e a eficiência do sistema cai. A solução está no planejamento antecipado, no acompanhamento nutricional e na definição de metas de crescimento desde a recria, garantindo que o animal atinja o peso e a reserva corporal ideais para cada fase produtiva”, explicou.
Os pilares essenciais para um programa reprodutivo eficiente, de acordo com Gilson são a nutrição, a sanidade, o manejo e a genética. Ele reforçou que essas premissas são conhecidas há muitos anos, mas precisam ser constantemente revisitadas e aplicadas no campo. “São fundamentos que devem ser lembrados e reforçados, a gente aprende por repetição. Além disso, apresentamos soluções práticas voltadas a vacas e novilhas, como o uso da ressincronização, o aumento do número de inseminações artificiais e a atenção rigorosa à qualidade do sêmen utilizado, fatores decisivos para o sucesso dos programas reprodutivos”, complementou.
Ao comentar sobre a influência da qualidade do sêmen nos resultados, o pesquisador destacou que o tema merece atenção redobrada. “A qualidade do sêmen impacta diretamente a taxa de prenhez, tanto pela genética do touro utilizado, quando se pensa em futuras reprodutoras, quanto pela qualidade microbiológica do material. Observo casos preocupantes de contaminação do sêmen que chega às propriedades, e esse é um ponto que precisa ser discutido com mais profundidade entre técnicos e produtores”, alertou.
Entre os principais desafios observados nas propriedades, o médico veterinário apontou a baixa condição corporal das fêmeas como um dos fatores que mais comprometem os índices reprodutivos. “Grande parte das falhas de concepção está associada a deficiências nutricionais. Animais com baixa condição corporal têm menor taxa de prenhez e maior perda gestacional. O produtor precisa pensar em controlar o crescimento da fêmea para que ela atinja entre 65% e 70% do peso adulto ao entrar na reprodução. Assim, ela terá uma boa condição corporal ao parto e conseguirá repetir cria, mantendo a produtividade do sistema”, concluiu.
O POTENCIAL DO BEEF ON DAIRY NO BRASIL
Na sequência, o doutor Brad Gilchrist apresentou a palestra “O Potencial do Beef on Dairy para fazendas brasileiras”, abordando uma prática que vem ganhando espaço no país: o uso de sêmen de raças de corte em vacas leiteiras para gerar bezerros com maior valor agregado. Gerente global de cadeia de suprimentos de carne bovina da Semex, Gilchrist iniciou sua explanação com uma provocação: “Como seria o animal de corte perfeito?”, um bovino com boa aparência, estrutura funcional e saúde superior. Para ilustrar o conceito, ele recorreu à inteligência artificial, pedindo à tecnologia que “desenhasse” o animal ideal, símbolo do potencial que a inovação genética pode alcançar.
A partir dessa reflexão, o pesquisador conduziu o público a pensar sobre os grandes desafios da indústria da carne bovina, entre eles a redução das emissões de carbono e gases de efeito estufa, o uso racional da água e a necessidade de responder às novas percepções dos consumidores sobre sustentabilidade. “Com a genética certa, é possível tornar o sistema mais eficiente, sustentável e lucrativo. O desafio está em conectar toda a cadeia, da cria ao processamento, para garantir rastreabilidade total e entregar ao consumidor final um produto de qualidade superior”, destacou Gilchrist.
O especialista apontou que a indústria do beef é complexa e fragmentada, com elos que muitas vezes não se comunicam adequadamente. Essa desconexão, segundo ele, compromete o controle sobre a origem dos animais e a consistência dos produtos oferecidos ao mercado. “Criar um produto de alta qualidade que os consumidores realmente queiram é o principal desafio da indústria. A genética é uma das chaves para isso, permitindo o foco em animais de elite e em programas de melhoramento que agregam valor do campo ao prato”, enfatizou.
Gilchrist lembrou que, tradicionalmente, a pecuária leiteira brasileira tem como objetivo principal a produção de leite, e não de carne, o que faz com que os bezerros machos sejam tratados como subprodutos do sistema. No entanto, ele defendeu uma mudança de mentalidade. “Para o sucesso do Beef on Dairy, é preciso enxergar esses animais como produtos da indústria da carne, e não como subprodutos da indústria do leite. Com gestão correta e genética direcionada, é possível gerar novilhos de alto padrão, com bom desempenho e qualidade de carcaça compatíveis com o mercado de corte”, afirmou.
O palestrante também destacou a importância da programação genética dentro das fazendas leiteiras, de forma a planejar cruzamentos que garantam rentabilidade e padronização. “Com o uso adequado das ferramentas genéticas e seleção bem orientada, conseguimos prever resultados e transformar a eficiência produtiva em lucro”, observou.
Em uma análise do mercado internacional, Gilchrist apresentou dados sobre as ofertas e demandas mundiais de carne bovina, evidenciando o papel do Beef on Dairy nesse contexto. Ele explicou que, a partir de 2015, os Estados Unidos começaram a utilizar sêmen sexado como estratégia para aprimorar simultaneamente o rebanho leiteiro e o de corte, o que resultou em um crescimento exponencial da produção de animais Beef on Dairy no país.
Entretanto, segundo o especialista, esse ciclo de expansão já apresenta sinais de estabilização. “O que veremos daqui para frente é uma desaceleração nesse crescimento nos Estados Unidos, à medida que a curva começa a se achatar. Isso abre uma grande oportunidade para outros países, como o Brasil, fortalecerem sua presença no mercado global de carne, aproveitando o avanço da genética e a capacidade de produção integrada entre leite e corte”, explicou Gilchrist.
SUPLEMENTAÇÃO A PASTO
Encerrando o 4º Fórum Brasil Sul de Bovinocultura de Corte o doutor Mikael Neumann ministrou a palestra “Desafios e o que esperar de resultados da suplementação a pasto”. Mikael é Engenheiro Agrônomo pela UTFPR, mestre em Produção Animal pela UFSM e doutor em Zootecnia pela UFRGS. Atua como Professor Associado da UNICENTRO (PR), com ampla experiência em nutrição e produção animal, integrando pesquisa e prática no campo.
Com uma abordagem prática e técnica, Neumann destacou que compreender o ambiente de pastagem é o primeiro passo para o sucesso da suplementação. “O ambiente de pasto é extremamente variável de uma propriedade para outra: relevo, tipo de solo, fertilidade, espécies forrageiras, disponibilidade de sombra e de água. Por isso, antes de pensar na suplementação ideal, o produtor precisa ter clareza sobre sua realidade produtiva e seus objetivos econômicos”, explicou.
O especialista ressaltou a importância de um checklist detalhado como ponto de partida. “É essencial avaliar o manejo do pasto, as condições das cercas, dos bebedouros e comedouros. Só a partir desse diagnóstico é possível traçar uma estratégia nutricional coerente com as metas da fazenda”, reforçou.
Segundo Neumann, a suplementação a pasto é o caminho do futuro para a bovinocultura de corte, especialmente em propriedades que buscam intensificação e eficiência no uso dos recursos naturais. Ele lembrou que o sistema de produção engloba três fases: cria, recria e terminação e que a fase intermediária, da recria a pasto, representa atualmente um dos maiores potenciais de ganho na pecuária. “É nesse ambiente que conseguimos obter o menor custo diário por animal e, ao mesmo tempo, melhor performance. O uso correto da suplementação acelera o desenvolvimento, melhora a eficiência alimentar e reduz o tempo até a terminação”, pontuou.
O palestrante destacou ainda que a suplementação pode ser aplicada de diversas formas e níveis, com impacto direto na produtividade. “Vacas suplementadas produzem mais bezerros e com melhor desempenho. Bezerros suplementados junto às mães desmamam com peso superior e seguem para a recria com vantagem significativa. Uma recria bem conduzida, que explora o máximo potencial do pasto com o suplemento correto, entrega animais de maior qualidade à terminação, encurtando o ciclo produtivo, aumentando o capital de giro e a rentabilidade da propriedade”, explicou.
Ao concluir, Mikael ressaltou que o sucesso da suplementação não está apenas na escolha do produto, mas na integração entre manejo, ambiente e estratégia nutricional. “Mesmo em propriedades menores, como é comum em Santa Catarina, é possível alcançar alta produtividade com planejamento, equilíbrio e eficiência. O desafio é transformar informação técnica em prática diária no campo”, finalizou.
PROGRAMAÇÃO GERAL
• 14º SIMPÓSIO BRASIL SUL DE BOVINOCULTURA DE LEITE
• 9º BRASIL SUL MILK FAIR
• 4º FÓRUM BRASIL SUL DE BOVINOCULTURA DE CORTE
• 2º SIMPÓSIO CATARINENSE DE PECUÁRIA DE LEITE À BASE DE PASTO
DIA 14/10 – TERÇA-FEIRA
13h45 – Abertura da Programação Científica 14º Simpósio Brasil Sul de Bovinocultura de Leite
PAINEL BEM-ESTAR ANIMAL
14h00 – Como conciliar produção de leite e sustentabilidade?
Palestrante: Dr. Ralf Loges
15h00 – Pontos críticos e práticos de bem-estar animal na atividade leiteira
Palestrante: Dra. Rosângela Poletto
16h00 – Milk Break
16h30 – Do clima ao conforto: como a ambiência impacta vacas e produtividade
Palestrante: Prof. Dr. Frederico Márcio Corrêa Vieira
17h30 – Mesa-redonda
18h00 – Abertura Oficial
18h30 – Palestra de Abertura do SBSBL - Mais Tempo, Mais Resultados: Como a IA pode apoiar a rotina do Atendimento Técnico
Palestrante: Alexandre Weimer
19h40 – Coquetel de Abertura na Milk Fair
DIA 15/10 – QUARTA-FEIRA
PAINEL REBANHO SAUDÁVEL E PRODUTIVO
8h00 – Gestão eficiente da diarreia neonatal
Palestrante: Dra. Viviane Gomes
9h00 – Prevenção das doenças reprodutivas: nosso calendário sanitário está adequado aos desafios do campo?
Palestrante: Dr. Álvaro Menin
10h00 – Milk Break
10h40 – Da mistura à boca da vaca: qualidade da TMR sem desperdício
Palestrante: Dr. João Ricardo Pereira
11h40 – Mesa-redonda
12h10 – Almoço
PAINEL EFICIÊNCIA NO CAMPO
14h00 – Como ser eficiente na atividade leiteira?
Palestrante: Dr. Wagner Beskow
15h00 – Mercado de Lácteos
Palestrante: Dr. Glauco Carvalho
16h10 – Milk Break
16h40 – Maximizando o aproveitamento da proteína: da dieta à produção
Palestrante: Dra. Marina Danés
18h00 – Happy Hour na Milk Fair
DIA 16/10 – QUINTA-FEIRA
PAINEL ADITIVOS
8h00 – Além do efeito ruminal: o papel dos tamponantes e alcalinizantes
Palestrante: Dr. Marcos Neves
9h00 – Ionóforos e sua contribuição na dieta de vacas em lactação
Palestrante: Euler Rabelo
10h10 – Milk Break
10h40 – Uso de eubióticos na pecuária leiteira: performance e saúde animal
Palestrante: Jill Davidson
11h40 – Mesa-redonda
12h10 – Encerramento e sorteio de brindes